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Uma poeta e um doce de poesia

Postado em 07 de junho de 2014.

Repórter: Iara Campos

Renata Aragão_foto por Rizza

Renata Aragão. Foto por Rizza.

Em tempos em que a poesia é alvo de críticas por ser vista por muitos como um gênero literário elitista, Renata de Aragão Lopes, “a confeiteira” lança o livro “Doce de Lira, Poesia à Mesa” com objetivo de tornar os versos acessíveis a todos. Renata é juiz-forana, poeta desde a infância, embebida em várias artes da cidade – do teatro ao cinema, onde atua como caracterizadora – além de advogada. Já publicou vários de seus trabalhos em concursos literários e desde 2009 escreve no blog Doce de Lira.

JFHipermídia: Renata, como começou a sua história com a poesia?

Renata: Comecei a me interessar pela poesia desde menina, nem sei precisar exatamente com que idade. Mas eu me lembro de ler poemas de uns quatro versinhos rimados para a minha avó. Eu era ainda bem menina, criancinha mesmo! Eu tenho registro na minha memória da minha avó se emocionando. A minha avó é uma referência de arte na minha infância. Ela não escrevia, ninguém na minha família escreve, então eu não posso dizer que tive uma influência direta de alguém ou que alguém lia pra mim ou que eu via alguém escrevendo. O que eu tinha eram os ouvidos ali da minha avó à disposição, algo que eu não sei dizer o que é, acho que é uma inclinação mesmo pra escrita.

JFHipermídia: Como você começou a pensar em publicar seus poemas?

Renata: Com 23 anos apareceu uma pessoa na minha vida, uma amiga minha que eu conheci nessa época, e lendo alguma coisa que eu tinha escrito, ela falou “Renata, entra em concurso literário porque é muito bom”, aí eu entrei num primeiro e fui selecionada. Na época eu não tive dinheiro nem pra entrar na antologia, então eu tive só um certificado, uma menção honrosa pelo poema… Foi assim que começou. Mais pra frente outra amiga, do Rio de Janeiro, me falou a mesma coisa. Foi até um episódio muito interessante. Eu fui assaltada no Rio, me roubaram dinheiro, anel e jóias… Fui pra casa e não conseguia dormir, aí escrevi um poema, sobre o que tinha acontecido. No dia seguinte fui contar pra essa minha amiga carioca e li o poema. Ela falou comigo: “Renata, tu é assaltada e escreve isso! Tem que entrar em concurso!”. Aí eu voltei a participar de concurso literário e comecei a levar isso mais a sério. E conseguindo sempre algum êxito. Ou era premiada ou classificada e entrava em antologias.

JFHipermídia: Qual é a opinião que você percebe que as pessoas têm da poesia hoje em dia?

Renata: Acho que as pessoas se sentem inaptas à leitura de poesia. Eu observo que a poesia foi colocada em um lugar inacessível. O espaço para poesia é muito pequeno e eu acho que é por isso. Alguém disse que poesia é muito difícil e ela é mantida como um produto da elite. Eu quero mudar isso. “Poesia à mesa” é justamente isso. Todo mundo se senta à mesa. Por que não todo mundo ter acesso à poesia? Quando eu criei o blog eu ouvi de muita gente “mas poesia, Renata? Poesia eu vou lá, leio e fico até intimidada de comentar, não sei o que escrever… não me sinto capaz de comentar um poema”.

JFHipermídia: Você falou o que significa a “Poesia à Mesa”. E o “Doce de Lira”, qual é o sentido?

Renata: O nome “Doce de Lira” também vem daí. É como se fosse a sobremesa da cesta básica, é indispensável no dia a dia. Todo mundo é capaz de ler e de compreender um verso. Se eu conseguir criar isso de alguma forma no universo daqueles que adquiriram o livro eu já vou me dar por satisfeita.

JFHipermídia: Então qual o público que você pretende atingir com os seus poemas de “Doce de Lira, Poesia à Mesa”?

Renata: Meu maior objetivo nesse projeto foi exatamente o de criar um público novo para a poesia. Não é atingir quem já lê. É atingir quem não lê. Então eu fiz muitas doações, porque muita gente me procura, mas não tem condições de adquirir. Penso também em criar concursos literários nas escolas para, de alguma forma, estimular quem ali na infância, como eu, já mostra um interesse pra escrever.

JFHipermídia: Você tem algum poeta que tenha servido de inspiração para o seu trabalho?

Renata: Diretamente não. Eu acho que tudo que eu vivo, tudo que vivencio me interfere. Eu vou a uma peça aqui em Juiz de Fora, isso me interfere; eu vejo um filme, me interfere; eu leio qualquer livro, isso pode me influenciar de alguma maneira, mas dizer que existe uma influência direta, não. Existe sim, óbvio, um grupo de autores e poetas que eu admiro muito, mas nem de longe eu sonharia em dizer que eu me inspiro neles ou que eu busco reproduzir de alguma forma o estilo deles. Parece que a gente quer sempre ocupar o lugar do morto. Carlos Drummond se foi aí começou alguém a dizer que o Afonso Romano de Santana seria um novo Drummond. Pra que criar um novo Drummond? Por que o lugar do morto tem que ser ocupado? O lugar dele é dele. É isso que eu penso também quanto ao meu estilo. Por que o meu estilo tem que ser atrelado ao do outro? É óbvio que nada é inédito e toda fala artística com certeza já é uma recriação da recriação. Nós já estamos num estágio humano de tanta produção artística, de tanta invenção que é muito difícil você ser original. E não acho que a gente tenha que ter esse ideal de ser original ou inédito. Pra mim a arte tem que ser emocionante. Se eu for escrever um poema, ele tem que tocar as pessoas sem precisar dizer nada novo. Só a emoção tem que ser nova.

JFHipermídia: Você que está cercada de artes por todos os lados, como você avalia o cenário artístico-cultural de Juiz de Fora?

Está bem promissor. Eu tenho a sensação de que já houve uma época em que a produção artística de Juiz de Fora era bem intensa e parece que houve um hiato, mas tenho sentido uma vontade muito grande por parte dos artistas juiz-foranos de se colocarem mais, de criarem mais, de trazerem mais público, uma vontade de retomar algo que nem eles mesmos viveram. Existe uma vontade muito grande de viver de arte em Juiz de Fora. A sensação que eu tinha até então era que todo mundo pra acontecer no universo artístico tinha que sair daqui, com exceções, por exemplo, do José Luiz Ribeiro que fincou o pé aqui. E eu tenho sentido agora as pessoas querendo ficar e outras vindo pra cá. Estou vendo uma vontade crescente mesmo tanto de pessoas que querem se profissionalizar e se estabelecer aqui e viver de arte como também um número grande de pessoas dispostas a ensinar.

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